“Está
resolvido, estou condecorado por antecipação. Por honra, coragem e
serviços prestados”, Laércio bradava pelo quarto, marchando em círculos. “Se por um acaso, trate-se de mim mesmo
o comandante competente para a cessão desta comenda, resta mais que evidenciado
meu merecimento de tanto! E, ademais, quem melhor que eu mesmo para
conhecer a mim e aos meus trabalhos?”, concluía.
A
cerimônia ficou marcada para o outro dia, ao pôr do sol, defronte
às ruínas da tola igreja dos dominados. A cidade, barulhenta em
sons miúdos, guardava no pó das ruas e nas letras incompreensíveis
de suas placas um passado não tão distante de tempo, mas de
distância infinita no sentimento.
A Rua, agora, só conhecia o Vento, qual, convenientemente, resiste
ao ataque de qualquer projétil. Os dois, graças a súbita inatividade
dos antigos ocupantes, puderam passar as manhãs brincando de jogar o
lixo de um canto a outro, riscar as paredes de outras areias, além
dos charmosos redemoinhos de folha e flores – de sorte que, se a
esta última houvesse espectador, apostaria na grandeza de sua
própria existência no espaço. Pois bem, não havia.
Chegado
o grande dia, Laércio apressou-se: tomou seu demorado banho na
banheira partida ao meio, arrumou seu traje belicoso de gala de única
manga, tomou tchái com sua linda e esquelética esposa, Madara.
Sempre tão silenciosa, sempre tão sentada.
No caminho à praça, deu-se com a Rua e o Vento, mas não se cumprimentaram.
Chegou. Tomou o grito dos abutres por trombetas de anúncio, cuidou-se para pisar no palanque com o pé direito, sacudiu os prateados cabelos que restavam por debaixo do quepe e saudou a multidão de micróbios.
“Ótimo,
aqui estamos mais uma vez”, repetiu Laércio em sua cerimônia de
condecoração. Repetiu tanto, tanto e tão alto que o som das palavras não
lhe faziam mais sentido, mas ao Eco não importava.
Acontece que os treze dias de discurso idêntico trouxeram ao Eco dúvida, e o repentino silêncio de
Laércio não foi percebido pelo Gênio Repetidor.
Tantas
vezes se repetiu, pelas curvas, a afirmação de estar, que estiveram. Todos, mais
uma vez.
Todos,
menos Laércio, que trocara os estertores por beijos endereçados a sua Madara, à janela.
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